Após novas diligências, processo que apura as 19 mortes é reenviado à Justiça
Bruno Wendel
A Polícia Civil já devolveu à Justiça o processo que apura as 19 mortes da tragédia de Mar Grande, quando a embarcação Cavalo Marinho I adernou momentos depois de deixar o terminal rumo à Salvador. Nesta sexta-feira (24), o episódio completa um ano.
Segundo a assessoria de comunicação da Secretaria da Segurança Pública (SSP), o delegado do caso, Ricardo Amorim, titular da 24ª Delegacia (Vera Cruz), reenviou na tarde desta quarta-feira (22) o processo à Justiça, que, por sua vez, deverá encaminhar ao Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA). Ainda de acordo com a SSP, foram feitos novos interrogatórios, mas nada que alterasse a conclusão do inquérito, divulgado pela Polícia Civil no dia 12 de abril deste ano.
O resultado da investigação policial coincidiu com a apuração da Marinha do Brasil que indiciou por homicídio culposo (quando não há a intenção de matar) e lesão corporal culposa o proprietário da CL Transportes Marítimos, empresa que opera a travessia, Lívio Garcia Galvão Junior, o engenheiro naval Henrique José Caribé Ribeiro, que assina laudo atestando as condições da embarcação, e o comandante da Cavalo Marinho I, Osvaldo Barreto.
Em nota, o MP-BA informou ao CORREIO que a 2ª Promotoria de Justiça de Itaparica, cuja titularidade é do promotor de Justiça Ubirajara Fadigas, recebeu a primeira versão do inquérito policial em 11 de maio de 2018 e o devolveu à Delegacia de Vera Cruz com pedido de novas diligências em 21 de maio de 2018.
No último dia 20 de agosto, o promotor de Justiça encaminhou ofício ao juiz da Vara Crime de Itaparica solicitando que a autoridade policial seja oficiada para que informe as providências adotadas. A Promotoria de Justiça aguarda a conclusão do inquérito policial e envio para o MP-BA para análise e adoção das medidas pertinentes.
Nesta quinta-feira (23), o MP-BA informou que o promotor Ubirajara Fadigas ainda não o recebeu o processo. O MP-Ba também analisa o inquérito da Marinha do Brasil, divulgado no dia 23 de janeiro.
Alerta
As condições da travessia Salvador/Mar Grande já era objeto de apuração do MP-BA desde 2006. “A precariedade, inadequação, insegurança e os altos valores do serviço de transporte hidroviário de passageiros realizado entre Mar Grande e Salvador foram objeto de apurações realizadas pelo Ministério Público desde 2006”, diz nota do MP-BA enviada ao CORREIO.
Foram ajuizadas ações civis públicas, nos anos de 2007 e 2014, tendo como alvo o serviço. Em 2007, o MP-BA ajuizou quatro ações civis públicas contra os proprietários das embarcações que realizavam o transporte sem a devida autorização do Poder Público Estadual. “Na época, as empresas operavam sem chancela prévia da Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia (Agerba), ou seja, de forma clandestina”, aponta o documento.
Nas ações, o MP-BA alerta sobre as inúmeras irregularidades no transporte de passageiros pelas embarcações, que colocavam em risco, diariamente, a segurança e a saúde de centenas de pessoas.
Em 3 de dezembro de 2014, ajuiza nova ação, solicitando a reforma dos terminais e das embarcações, a renovação dos coletes salva-vidas e outras medidas que assegurassem a saúde e segurança dos usuários. Após esta ação, a Promotoria de Justiça fez 11 petições para agilização do seu julgamento, mas não houve resposta da Justiça.
Após a tragédia, o MP-BA fez um pedido de tutela cautelar de urgência para suspensão do serviço, em 29 de agosto de 2017, e ajuizou uma nova ação civil pública, em 4 de outubro de 2017, requerendo a cassação do serviço prestado pelas empresas CL e Vera Cruz Transportes Marítimos Ltda. Esta ação encontra-se na Justiça.
Indiciados
Nos inquéritos da Polícia Civil e da Marinha, uma série de fatores são elencados para a ocorrência do acidente e que alguns cuidados poderiam ter evitado a tragédia. Para as investigações, o comandante da Cavalo Marinho I, Osvaldo Barreto, tinha competência suficiente para retornar a embarcação diante de mau tempo. Mas em entrevista ao CORREIO, ele rebateu alegando que não teve culpa alguma do acidente.
Não podia voltar com a lancha naquele momento. Fui pego de surpresa. Como é que volta?”, declarou ele. O CORREIO procurou o segundo indiciado nos inquéritos, o engenheiro naval Henrique José Caribé Ribeiro, professor do Departamento de Matemática do Instituto Federal da Bahia (Ifba). Por telefone, ele confirmou que era o responsável pelo projeto da embarcação. “Sim, sou eu, mas no momento não posso falar”, disse ele na terça-feira (21), antes de encerrar a ligação. Nesta quinta (23), o CORREIO voltou a ligar para o celular do engenheiro naval, mas o aparelho estava desligado.
Segundo as investigações, Henrique José disse que cometeu um erro de cálculo, mas que isso não foi decisivo para o acidente. No entanto, Polícia e Marinha discordam - os números corretos teriam deixado claro que a embarcação estava instável, ela não teria sido liberada para a navegação e o acidente não teria acontecido.
As investigações apontaram que foi o empresário Lívio Garcia Galvão Junior, proprietário da CL Transporte Marítimos, empresa responsável pela Cavalo Marinho I, quem mandou instalar pesos extras que foram encontrados pelos peritos na embarcação. Ele alegou, à época, que fez a alteração a pedido de comandantes que pilotaram a embarcação. No entanto, o CORREIO o procurou através de ligações, e presencialmente, mas o empresário não foi localizado.