Ciências Sociais Aplicadas – Cérebros da Ufba https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba Conheça alguns dos maiores dos pesquisadores da Bahia Sat, 27 Jun 2020 12:36:03 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=5.3.17 Wilson Gomes: o filósofo que discute comunicação e política nas redes sociais https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/wilsongomes/ https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/wilsongomes/#respond Thu, 25 Jun 2020 04:14:30 +0000 https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/?p=2924 Professor da Ufba foi à CPMI das fake news, no Congresso Nacional; tema é linha de pesquisa Vez ou outra, o professor Wilson Gomes precisa lembrar […]

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Professor da Ufba foi à CPMI das fake news, no Congresso Nacional; tema é linha de pesquisa

Vez ou outra, o professor Wilson Gomes precisa lembrar a quem o acompanha: ele não gosta de política. Se gostasse, faria política. Andaria em círculos partidários. Assumiria paixões por um ou outro lado. Mas pesquisar política, comunicação e democracia é diferente.

“Eu estudo política para entender como funciona e ajudar as pessoas a entender. Não sou militante. Nunca fui”, diz ele, que, hoje, aos 56 anos, é um dos principais nomes da ciência brasileira a discutir o tema em ambientes digitais.

Mais do que isso: faz parte de um grupo de intelectuais do país que conseguiu sair de ambientes acadêmicos. Milhares de pessoas acompanham suas ideias sobre o tema, quase que diariamente, em redes sociais.

Com 11 livros publicados, o professor Wilson Gomes já estava acostumado a ser referência em sua área. O mais vendido, Transformações da Política na Era da Comunicação de Massa, pode ser considerado um sucesso editorial em um nicho. Lançado em 2004, teve mais de 3,5 mil exemplares impressos. É figurinha conhecida na bibliografia de cursos de Comunicação e Política. Não é difícil encontrar estudantes, mesmo na graduação, que tenham lido a obra completa.

Livro Transformações da Política na Era da Comunicação de Massa é um sucesso de nicho
(Foto: Divulgação)

Por muito tempo, era esse o seu público. Nos últimos anos, porém, teve que se adaptar à nova audiência: aqueles que, dentre as diferentes profissões e áreas do conhecimento, começaram a se interessar pelos seus comentários sobre política e democracia.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Entre pílulas diárias e textões, chamou atenção pela linguagem acessível e por uma ou outra dose de humor que acrescenta aos pensamentos. “Precisamos da lucidez, sensibilidade e inteligência de gente como ele”, avaliou uma das seguidoras de sua página no Facebook, em fevereiro deste ano, com direito a emojis de coração. Outra, em agosto do ano passado, disse que o mundo precisava de olhar crítico. “Além de humor inteligente com uma boa dose de cinismo”, completou.

Só em seu perfil pessoal no Facebook são quase cinco mil amigos, além de mais de 38 mil seguidores. Na página que leva seu nome e onde publica os mesmos textos, tem outras 23 mil curtidas. O perfil no Twitter, onde participa desde 2009, tem mais de 34 mil seguidores. Os números de engajamento fariam inveja a influenciadores digitais que ganham a vida com isso: impacto de 1,4 milhões de contas no Twitter em 28 dias e um alcance três vezes maior no Facebook.

Em sua página no Facebook, Gomes tem mais de 23 mil curtidas
(Foto: Reprodução/Facebook)

“Cresci, mas é um crescimento controlado”, diz ele, que reforça que não faz questão de aumentar os números. Tem a impressão de que as pessoas não querem ler apenas comentários políticos, mas comentários políticos partidários. Se resolvesse ser um comentarista petista, por exemplo, escolhendo um lado, acredita que seu público seria maior.

“Mas isso é ruim para o meu trabalho intelectual. Naturalmente, deve ter um impacto falar para três, quatro milhões de pessoas. Do ponto de vista acadêmico, considero isso um trabalho de extensão”, afirma, referindo-se à atividade que, ao lado da pesquisa e do ensino, costuma ser um dos pilares das grandes universidades do país.

No caso dele, a pesquisa e o ensino são vinculados à Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Ufba), onde chegou em 1989, ainda com vínculo de bolsa de recém-doutor. Professor titular desde 2000, ele é um dos pesquisadores da instituição que têm produtividade 1A pelo CNPq.

Nos últimos três meses, porém, o professor Wilson viu sua rotina ser alterada pela pandemia. Teve que sair do laboratório e da convivência diária com os pesquisadores residentes do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) que coordena. As reuniões semanais ainda acontecem, pelo menos, uma vez por semana, mas, para ele, não é a mesma coisa. O trabalho, por outro lado, aumentou.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

“Sem as demandas de viagem, participei de mais conferências, aulas e mesas-redondas (lives) do que em períodos normais. E trabalhamos ainda mais em artigos e ofertas de cursos de extensão e pesquisas”, exemplifica.

Ano diferente

Os acontecimentos no cenário político brasileiro davam sinais que 2018 seria um ano complexo. No mínimo, diferente. Foi por isso que o professor Wilson decidiu fazer algo que não costuma fazer: ter deadlines. Hesitou no início. Não gosta de prazos. Se tiver uma data limite, deixa o texto para o último momento. Sem limites, é capaz de fazer dois ou três por dia.

No fim, acabou aceitando se tornar colunista de veículos de comunicação. Era mais um passo para contribuir com a desinformação. Desde então, é colaborador da Revista Cult e da Rádio Metrópole, em Salvador. Para os dois, prepara comentários semanais. O acerto é o mesmo – no dia que lhe derem uma pauta ou retirarem uma linha do que tiver escrito ou dito, deixará o posto.

Nos últimos meses, antes da pandemia, as viagens aumentaram. Passou a ser convidado, com frequência, para falar inclusive em Tribunais Regionais Eleitorais. O sentimento de dever, enquanto pesquisador, talvez tenha sido a principal razão para que aceitasse falar na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das fake news, no Congresso Nacional, em outubro.

Wilson Gomes participou da CPMI das fake news, no Congresso Nacional
(Foto: Divulgação)

O professor Wilson Gomes foi o primeiro a falar – fora as reuniões internas. Em casa, houve resistência. Os mais próximos não queriam que ele fosse. Tinham medo do que podia acontecer. Podia ser linchado, ser alvo de ataques mais graves.

“De fato, havia muita tensão no ar. Mas achei que eu, como coordenador de um instituto que trabalha com esse tema – porque fake news hoje é uma linha de pesquisa da gente – não podia não ir. Não podia me privar de ir apenas pela minha segurança. Eu tinha de ir, mas tinha de ir como pesquisador”, explica.

A estratégia foi apresentar todos os dados. Informação com dados. E deu certo. O vídeo de sua fala, com cerca de 10 minutos, pode ser facilmente encontrado em algumas plataformas.

Foi a primeira e única participação da CPMI, que continua com uma lista imensa de participantes, passando por celebridades e influenciadores digitais. O humor ácido pelo qual é conhecido por alunos e colegas, porém, aparece quando cita o deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP), que deu seu depoimento à comissão dias depois do professor.

“Acho que ele fez mais sucesso do que eu. Imprimiu os tuítes. Eu não tive a ideia de imprimir os tuítes do Olavão (o astrólogo Olavo de Carvalho). Já me quebrou. Já não sou o cara mais influente da CPMI das fake news. Agora é Alexandre Frota”, diz, aos risos.

As fake news também são tema de uma pesquisa mais recente – agora, também estuda o uso daquelas sobre a pandemia do coronavírus em plataformas digitais. “Os nossos temas estão efervescentes, já que trabalhamos com os efeitos sociais dos usos de tecnologia e a demanda por questões relacionadas a fake news e as ferramentas para transparência e para governo eletrônica cresceram”, diz.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Europa

A pesquisa em comunicação e política veio aos poucos. Por muito tempo, não foram seus principais objetos de estudo. Aos 17 anos, ainda adolescente, fez vestibular para Filosofia na Ufba. Na faculdade, um professor sugeriu que fosse estudar fora. Disse que podiam conseguir uma bolsa para que depois ele voltasse ao Brasil.

“Os cavalos foram passando e eu montei. Não tinha dinheiro, então, tinha que aproveitar a oportunidade. Não imaginava, de jeito nenhum, morar na Europa”, lembra.

Wilson saíra de Camacã, no Sul do estado, onde cursou o Ensino Médio. Antes, até os 15 anos, morou em uma fazenda no interior de Mascote, uma cidade vizinha. O nome da propriedade era sugestivo: Fazenda Brasil.

Na casa onde cresceu, os pais não tiveram educação formal. Por muito tempo, o único livro que tinha no imóvel era uma Bíblia Sagrada. Alguns anos depois, o pai comprou uma enciclopédia. Mesmo assim, desenvolveram o hábito da leitura. A mãe, leitora voraz, consumia de literatura de cordel a fotonovelas.

Uma vez por semana, iam à banca de revistas de Camacã, e os pais permitiam que comprasse o que quisesse. Escolhia, quase sempre, quadrinhos de Tex Willer, enquanto o irmão comprava revistas esportivas e a mãe, a fotonovela. “A livraria da gente era a banca de revista. ‘Seu Sergipe’ foi muito importante na minha vida”, brinca.

Da Fazenda Brasil, foi para a Itália. Não falava nada de italiano. No colégio estadual onde estudou, tinha aprendido francês e um pouco de inglês. Aprendeu a língua nova ‘na marra’. Lá, fez duas graduações simultâneas: Filosofia, na Pontificia Università San Tommaso D’aquino, e Teologia, na Pontificia Universitá Gregoriana.

Na época, cogitava ser padre. Mas, na graduação, estudou outras coisas, como Antropologia. Decidiu continuar estudando. Emendou mestrado e doutorado em Filosofia, ambos na Pontificia Università San Tommaso D’aquino. Completou os dois em apenas quatro anos. Aos 24, já era doutor. Hoje, só para dar uma ideia, o tempo médio apenas de um doutorado costuma ser de quatro anos.

“Eu sempre fiz no menor tempo possível, primeiro porque não recebia bolsa nenhuma do governo brasileiro. Não recebia dinheiro dos meus pais. Tinha que trabalhar para me manter. O melhor era ficar o mínimo possível”, conta.

Na Filosofia, tinha duas grandes áreas de interesse: a filosofia da linguagem, que incluía a teoria dos signos, interpretação e passando pela filosofia da cultura; e a teoria democrática, que tinha temas relacionados à filosofia política e à ética.

Facom

Ao fim do doutorado, voltou ao Brasil. Não conhecia ninguém, não tinha mais nenhuma relação aqui. Não recebia convites de universidades. “Alguns departamentos fechavam claramente as portas porque as pessoas queriam aproveitar a chamada prata da casa”.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Foi assim por seis meses. Mesmo antes de chegar ao país, vinha enviando cartas a departamentos de Filosofia em todo o Brasil, se apresentando e dizendo que estava disponível para oportunidades de trabalho. As respostas vinham de instituições privadas – em geral, católicas – e de algumas públicas.

“Podemos solicitar uma bolsa de recém-doutor no CNPq”, diziam. Outra resposta comum era de que tinham concurso em vista. Quando os editais fossem lançados, ele poderia participar. Na época, não tinha um lugar que preferisse. Queria estar mais perto da família e, naquele contexto, só de estar no Brasil, era um avanço.

Até então, o que lhe parecera mais atraente fora uma proposta da Universidade Federal de Santa Maria, que tinha um mestrado de Filosofia. Era um dos locais que sugeria pedir uma bolsa de recém-doutor até que tivesse concurso. Wilson preparou o projeto.

Na véspera do último dia do prazo de envio, encontrou um amigo de Camacã. O amigo ficara sabendo que a Faculdade de Comunicação da Ufba pretendia abrir um mestrado em Comunicação e Cultura no ano seguinte.

O rapaz falou de Wilson ao já professor Albino Rubim, que também fez parte da lista dos pesquisadores 1A da Ufba – hoje, ele é pesquisador sênior. “Chegou um cara aí com doutorado, que trabalha com filosofia da cultura. Ele está mandando projeto para Santa Maria”, anunciou. “Pede para ele vir aqui antes”, respondeu Rubim.

Na mesma noite, Wilson pegou um ônibus de Jequié, no Centro-Sul baiano, com o projeto debaixo do braço. Conheceu Albino Rubim, que lhe mostrou a grade de disciplinas. Na lista, algumas bem próximas do campo que trabalhava: semiótica, teoria da interpretação, estética.

“Você não quer mudar esse seu projeto para cá?”, propôs Rubim. Foi quando pensou na família, nos pais. Era filho “de pai velho”, como frisou em pelo menos dois momentos da entrevista ao CORREIO. “Usei Liquid Paper (a marca de corretivos) para apagar Santa Maria e escrever Federal da Bahia em cima. Usei exatamente o mesmo projeto para a Ufba”, conta o professor Wilson.

Assim, chegou à Facom em 1989 – o mestrado em Comunicação e Cultura, o primeiro dos cursos do chamado PósCom, acabou tendo início apenas em 1990.

Na internet

Filosofia, antropologia, filologia clássica, teologia, pós-doutorado em cima. O professor Wilson tinha muitos interesses. Diz que seu percurso nas ciências humanas foi um tanto ‘vagabundo’.

“A vida é muito curta para tantos interesses que a gente tem. Se tivesse mais vida, provavelmente teria estudado economia, direito, coisas assim”, reflete.

Mas, na Facom, se firmou em duas linhas: comunicação e política, com estudos sobre democracia, e interpretação. Por anos, foi professor de semiótica na graduação. Por aí, incluía cinema, estética. Ao se aproximar dos 50 anos, viu que tinha que se concentrar em uma só área, até para trabalhar de forma mais institucional.

Os ambientes digitais eram seu interesse desde a década de 1990, assim como de outros professores da Facom. De 2005 em diante, boa parte da energia já estava concentrada na comunicação política em ambiente digital.

(Foto: Acervo pessoal)

“Quando vieram os movimentos sociais em 2011, a internet de revolução, a Primavera Árabe, a gente já estava trabalhando. Já tinha muitas teses sobre participação em meios digitais, depois fomos para transparência, dados abertos. Fomos acompanhando as evoluções”.

Investiu na criação do Centro de Estudos Avançados em Democracia Digital (Ceadd), que foi também a base para a criação do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) em Democracia Digital. O instituto foi aprovado em 2014, mas os recursos só começaram a ser liberados em 2016.

Ao todo, são 120 pesquisadores, contando a partir de doutorandos. Ou seja, se a conta incluísse mestrandos, o número seria ainda maior. Só de professores pesquisadores, entre brasileiros e estrangeiros, são quase 70. Dos 120, 15, em média, são da Ufba.

“A gente tem que fazer a gestão disso, fazer relatório, manter essa estrutura. Se quebra o ar-condicionado, (Abraham) Weintraub (ministro da Educação na época da entrevista) não manda consertar. A máquina fica obsoleta. Precisamos ter autossuficiência, porque são seis anos de INCT”.

Pesquisador 1A

A bolsa em produtividade de pesquisa veio depois que se tornou professor efetivo da Facom, em 1992. Ele não sabe, ao certo, quando se tornou 1A – possivelmente, depois que se tornou professor titular. Não era um objetivo, diz, até por ser algo muito limitado.

“Tanto que eu acho que a Facom sempre foi muito superestimada nesse conjunto. Se você pegar dentro da área de comunicação, de fato, a gente tem um pouco de hegemonia”, analisa.

Dos 14 pesquisadores 1A com bolsas em Comunicação, em todo o Brasil, dois são da Facom. Até 29 de fevereiro de 2020, eram três, com o professor Marcos Palacios, que não solicitou a renovação da bolsa de produtividade após essa data.

A Ufba ainda tinha outro pesquisador 1A com bolsa de Comunicação até fevereiro – o professor Albino Rubim, que, hoje, é ligado ao Instituto de Artes, Humanidades e Ciências (Ihac), mas que, por muito tempo, foi lotado na Facom. Desde o início de março de 2020, ele se tornou pesquisador sênior.

Ao longo da carreira, Wilson influenciou outros pesquisadores. Criou uma rede que, atualmente, está espalhada por universidades em Minas Gerais, Paraná e Alagoas. Na família, a filha está terminando Direito e o filho cursa Educação Física. É casado com a também professora titular da Facom Maria Carmem Jacob, uma das principais pesquisadoras de televisão e telenovelas do Brasil.

Como alguns de seus colegas, uma de suas maiores dificuldades é tirar férias. Mesmo apaixonado por cozinhar, jardinagem e tênis – chega a passar quatro horas por dia na quadra, nos finais de semana – costuma escutar, em casa, que não tira um tempo livre.

Passou a ter um costume, que transferiu para os orientandos, de trabalhar junto. Outro dia, numa manhã de domingo, quando não há aulas na Ufba, precisou voltar ao INCT. Viajaria para uma palestra em Aracaju (SE) e tinha que buscar o tablet esquecido.

“Tomei um susto quando vi que tinha três (pesquisadores) trabalhando aqui. O trabalho junto, compartilhado, é muito mais rentável. Mesmo quando a Facom está fechada”. Esse hábito, porém, teve que ser interrompido na quarentena.

Formação acadêmica, segundo o Lattes:

  • 1986 – 1988
    Doutorado em Filosofia – Pontificia Università San Tommaso D’aquino, P.U.S.T, Itália.
  • 1984 – 1986
    Mestrado em Filosofia – Pontificia Università San Tommaso D’aquino, P.U.S.T, Itália.
  • 1981 – 1985
    Graduação em Teologia – Pontificia Universitá Gregoriana, P.U.G., Itália.
  • 1981 – 1984
    Graduação em Filosofia – Pontificia Università San Tommaso D’aquino, P.U.S.T, Itália.

Produtividade em números

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Ana Fernandes: com um olho na pesquisa e o outro na cidade, criou observatório de bairros em Salvador https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/anamariafernandes-2/ https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/anamariafernandes-2/#respond Thu, 25 Jun 2020 04:12:00 +0000 https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/?p=2543 Nas horas vagas, paulista tem como um de seus passatempos passear e olhar a paisagem Em 2019, a professora Ana Maria Fernandes conseguiu desenvolver um novo […]

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Nas horas vagas, paulista tem como um de seus passatempos passear e olhar a paisagem

Em 2019, a professora Ana Maria Fernandes conseguiu desenvolver um novo projeto em sua vida. Ao longo da carreira, foram vários. Esse, porém, foi um tanto diferente. “Tirei um mês de férias e foi bem interessante”, diz, com naturalidade. Não é o único projeto do tipo: tem planos de instituir finais de semana em sua vida – sextas, sábados e domingos livres.

Ana é professora aposentada da Universidade Federal da Bahia (Ufba) desde 2018. Mesmo assim, não pensa em parar. “É parte da minha vida. Seria como se eu abdicasse de uma parte realmente muito significativa de mim. Até agora, não consigo”.

Nem mesmo durante a quarentena imposta pela covid-19, o ritmo foi menos intenso. Enquanto cumpre o próprio distanciamento social, ela dá conta dos compromissos que já tinha e dos novos cenários que foram aparecendo.

Talvez seja redundante, a essa altura, dizer que ela dedica muito de seu tempo ao trabalho. Professora da Faculdade de Arquitetura desde 1988, Ana já fez um pouco de tudo. Foi diretora de unidade, consultora de órgãos públicos que vão de secretarias municipais a programas de bolsas na Espanha, conselheira fiscal do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) na Bahia, presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (Anpur).

Enquanto desenvolvia cada função, se fascinava com a cidade. Cada aspecto do ambiente urbano, com suas dinâmicas, problemas e destaques, lhe parecia interessante. Foi o que a fez perceber que, ainda que apaixonada pela arquitetura, era o urbanismo sua maior paixão. A possibilidade de existir mais trabalho coletivo, no urbanismo, era o que a atraía.

“Ainda que a produção da arquitetura sempre indague a sociedade como um todo, culturalmente, tecnicamente, socialmente, o urbanismo parte do coletivo. Essa questão sempre me intrigou”, explica a professora de 65 anos.

Nos últimos meses, com seu grupo de pesquisa, ela continuou fazendo o acompanhamento das políticas criadas para as cidades. “Esse é um período de aceleração muito grande das políticas urbanas e isso gerou uma apresentação no congresso virtual da Ufba”, conta, referindo-se ao evento virtual que aconteceu em maio.

Fragilidades

A pandemia acabou conectando a pesquisa ainda mais à conjuntura atual. Para a professora Ana, as fragilidades nas cidades vieram à tona com muita força nesse momento; inclusive, contribuindo para virulência da doença. É como se houvesse um reposicionamento das ausências de infraestrutura nos municípios brasileiros. 

“Aquilo que se fala que o Brasil resolveu o problema da água, da infraestrutura, da saúde pública… Numa situação como essa, com as características que essa pandemia tem, falta água, falta saneamento, as encostas continuam desabando e pessoas alagadas. Isso torna o cenário ainda mais dramático. Se você tem que lavar a mão e não tem água, é uma situação quase kafkiana”, analisa, numa referência à obra do escritor austríaco Franz Kafka.

Autor de livros como A Metamorfose e O Processo, Kafka se tornou uma referência para citar situações que parecem absurdas, surreais ou mesmo que remontam a um pesadelo. Por outro lado, ao mesmo tempo, a professora acredita que é preciso analisar que tipos de demandas devem ser atendidas nos bairros populares. 

Nesse contexto, para ela, os agentes comunitários de saúde são de extrema relevância. “Claro que a questão do tratamento final, com respiradores, hospitais de campanha e UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) é importante. Mas todo o cuidado de proximidade, que é possível fazer através dos agentes comunitários de saúde, ficou no escuro”.

Mulheres

Foi com esses interesses de pesquisa que ela se tornou uma das principais pesquisadoras de sua área, no Brasil. Ana Maria é uma das pesquisadoras com produtividade 1A no CNPq na Ufba, o que significa dizer que ela está no nível mais alto da pesquisa científica no órgão federal. Mais que isso: ela é uma das duas únicas mulheres da lista, ao lado da professora Paola Jacques, também da Faculdade de Arquitetura.

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

O dado a surpreendeu. Não o fato de a outra pesquisadora ser justamente uma colega de área – a Arquitetura e o Urbanismo, ao longo dos anos, têm sido associados, em maioria, a profissionais mulheres. Por muito tempo, o próprio vestibular da Ufba já teve entrada de 80% de mulheres na graduação.

“Acho que tem a ver com geração. Lá atrás, só tinha homem. E se a gente olhar todas as bolsas do CNPq, vai ter mais mulheres, mas de qualquer forma, não tenho dúvida de que haverá muitas mulheres na Ufba com plenas condições de serem pesquisadoras 1A”, opina.

Na Ufba, de fato, quando são observadas todas as 209 bolsas de produtividade, a diferença diminui: a proporção passa de apenas 12,5% de mulheres entre as pesquisadoras 1A para 40% no universo total, com 80 bolsistas em todas as classificações.

O número, porém, ainda é pequeno. A maioria das pesquisadoras do CNPq na Ufba está na classificação 2 do órgão – 53 delas. Outras 12 são classificadas como 1D, enquanto as que estão nos níveis 1C e 1B são oito e cinco, respectivamente. Entre as áreas, as mais frequentes são Saúde Coletiva, que tem oito pesquisadoras; Artes, que tem seis, e Letras, com cinco. Historicamente, a presença de mulheres é maior nessas áreas.

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

Urbanismo

Paulista de Birigui, município no interior de São Paulo, aos 17 anos, Ana Fernandes escolheu Arquitetura e Urbanismo no vestibular. A ideia sobre o campo, em sua própria definição, era bem pueril.  Foi justamente na época em que um primeiro arquiteto chegara na cidade.

O curso só era oferecido nas grandes universidades, como a de São Paulo (USP) e a Presbiteriana Mackenzie. Ou seja: junto com a entrada na faculdade, viria também uma mudança para uma cidade grande.

Aprovada na USP, começou a ter contato com pesquisa desde cedo. Já no segundo ano do curso, convivia de perto com professores que se dedicavam à pesquisa e estimulavam os estudantes. Desde a década de 1970, já era uma opção para a formação dos estudantes.

Filha de um bancário e de uma dona de casa, Ana não tivera contato com produção científica em nenhum outro momento da vida. Em casa, os pais valorizavam muito a educação. Sabiam que era um ponto de partida para os filhos. Mesmo assim, a pesquisa não fazia parte do horizonte.

Logo percebeu que gostava mais do urbanismo. O ambiente ajudava. “A gente vivia uma ditadura militar com expansão brutal das cidades. E um outro elemento muito importante de todo esse processo é o próprio movimento estudantil”, explica.

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

Tinha sido líder do movimento estudantil? “Fui massa do movimento estudantil”, responde. Na faculdade, a professora Ana fazia parte de uma tendência política chamada Liberdade e Luta, de influência trotskista. Foi nessa época que conheceu aquele que seria um dos principais motivos para ter decidido vir para a Ufba: o baiano Milton Santos Filho, então uma das lideranças do movimento e, como o nome indica, herdeiro do renomado geógrafo nascido em Brotas de Macaúbas, na Chapada Diamantina.

Os dois se reencontrariam anos depois, em São Paulo. Foram juntos para a França e, de lá, decidiram aportar em Salvador, cidade natal dele. Àquela altura, Ana chegara à capital baiana com um doutorado e a possibilidade de solicitar uma bolsa de desenvolvimento científico regional com foco no Nordeste.

Com essa bagagem, bateu na porta do mestrado em Arquitetura e Urbanismo – naquela época, em 1985, o doutorado ainda não existia. “Falei com o professor Pasqualino (Magnavita, um dos pesquisadores 1A) e o professor Eliodoro Sampaio. Eles me acolheram prontamente”, lembra.

Olhar para a cidade

Entre bolsas e vínculos como de professora visitante ou substituta, passaram-se sete anos na Ufba. O concurso para docente efetivo só aconteceu em 1992. Ao longo de todo esse período, desenvolvia estudos que se apropriavam tanto do Urbanismo quanto da História, da Geografia e da Sociologia.

São disciplinas que, no processo, permitiram que ela compreendesse o processo de estruturação das dinâmicas urbanas, desigualdades e segregação. “Ao longo do tempo, isso vai se desdobrando em dois caminhos principais. Um que é a história do urbanismo e da cidade, que é um outro jeito de você se apropriar do próprio caminho e ter a possibilidade de entender a temporalidade dos processos”, diz. Ao mesmo tempo, ela focava também em políticas urbanas e em entender a relação do Estado com a cidade.

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

Esse olhar para a cidade a acompanha. Mesmo nas horas vagas, um de seus passatempos é passear por Salvador e olhar a paisagem – principalmente, entre o Centro, a Península de Itapagipe e o Subúrbio Ferroviário.

“Salvador é uma cidade muito bonita, embora muito desigual. (Meu costume) É sempre observar a cidade, se estou passando pela Avenida Paralela, pela Orla, se vou para o Miolo, pela Baía de Todos os Santos. Acho que tem uma certa atenção aguçada com a cidade”, explica.

Ela foi a criadora e uma das coordenadoras do Observatório de Bairros em Salvador, que construiu uma plataforma que reúne indicadores sobre temas de bairros da capital baiana. Mais recentemente, começou a desenvolver um projeto sobre a reforma urbana no Brasil, na década de 1960, diante de todo o contexto social e político da época.

Com a maioria dos pesquisadores desta lista, a professora Ana nunca teve o objetivo de chegar à classificação 1A. É difícil lembrar a data em que chegou ao maior degrau. Talvez 2013, 2014; é certo que alguns anos depois de ter começado, no início da década de 2000.

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

“Claro que, quando me tornei, fiquei feliz. Mas sou uma pessoa modesta, de forma geral. Não tenho ambição nesse sentido de ter essas metas todas a serem conquistadas. Realmente, não sou uma pessoa ambiciosa, mas não tenho nada contra ninguém que seja”, reitera.

Em casa, acabou ajudando a disseminar a veia de pesquisadores na família. Enquanto o marido fora professor da Escola de Economia, em vida, a filha fez doutorado em Comunicação e segue na área. O filho, que cursou Engenharia Mecânica, faz hoje mestrado em Economia na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo.

“Acho que tem, aí, uma sementinha que foi plantada”.

Para ela, hoje, a ciência vive uma dupla crise. A primeira vem justamente do negacionismo. A outra, por outro lado, vem de um aspecto mais elitista. “É uma crise em termos do próprio modo que se construiu, com esse saber extremamente centralizado, vertical, descolado da realidade. Temos, aí, dois desafios políticos e também epistemológicos”, diz.

Formação acadêmica

  • 1982 – 1985
    Doutorado em Amenagement Et Environnement – Université Paris-Est Créteil Val-de-Marne, UPEC, França
  • 1981 – 1982
    Mestrado em Diplôme D’études Approfondies – Université Paris-Est Créteil Val-de-Marne, UPEC, França
  • 1979 – 1979
    Especialização em Planejamento E Participação – PUC-SP
  • 1974 – 1978
    Graduação em Arquitetura e Urbanismo – Universidade de São Paulo

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André Lemos: o engenheiro que desbravou as ciências da comunicação e a cibercultura https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/andrelemos-2/ https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/andrelemos-2/#respond Thu, 25 Jun 2020 04:09:43 +0000 https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/?p=2881 Ele é um dos 700 cientistas brasileiros mais citados em todas as áreas No início dos anos 1990, a internet ainda era algo novo; quase uma […]

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Ele é um dos 700 cientistas brasileiros mais citados em todas as áreas

No início dos anos 1990, a internet ainda era algo novo; quase uma coisa escondida. Ninguém sabia muito bem o que estava acontecendo. Não era assim só no Brasil – mesmo na França, onde o professor André Lemos cursava o doutorado em Sociologia na Université Paris Descartes, a Paris 5, na capital francesa, o assunto era novidade. 

Até na França, ele foi um pioneiro: começou a estudar cultura digital em 1991. “Pierre Lévy estava na minha banca. Depois, viramos amigos e ele me disse que minha tese de doutorado foi a primeira sobre o tema”, lembra o professor, referindo-se ao sociólogo francês que é um dos mais importantes pesquisadores da cibercultura do mundo. 

A tese inovadora vinha com o assunto logo no tema: o título, em francês, era algo como ‘Cibercultura – as novas tecnologias e a sociedade contemporânea’. A parceria entre os dois continua até hoje: em setembro de 2019, inclusive, Lévy veio a Salvador para participar do Fronteiras do Pensamento em um debate mediado justamente pelo professor André Lemos. 

Filósofo francês Pierre Lévy participou do Fronteiras do Pensamento Salvador 2019; na foto, André Lemos está à esquerda e Levy ao centro
(Foto: Divulgação/Fronteiras do Pensamento/Erick Salves)

“Acho que conservo isso até hoje. Uma espécie de inquietação teórica e epistemológica se deu pela mudança de área e hoje estou na Comunicação porque, na Sociologia, a grande revolução é que essas máquinas estavam se transformando em máquinas de comunicação”, explica. 

Hoje – ou melhor, desde 1997 – ele é professor da Faculdade de Comunicação (Facom) da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Lemos está no mais alto nível da carreira em dois aspectos: desde 2014, é professor titular da Facom, além de ser um dos pesquisadores com produtividade 1A do CNPq na Ufba, o que indica o nível mais alto da pesquisa científica. 

“Eu tive acolhimento na Facom para trabalhar com isso (cultura digital). Acho que conservo essa inquietação na minha própria área para buscar energias para compreender o contemporâneo”, diz ele, hoje com 58 anos. 

Assim como os colegas, o professor André teve a rotina nas salas na Facom alterada pelo avanço da covid-19. De casa, trabalha normalmente, exceto pelas aulas suspensas. 

“Reúno meu grupo de pesquisa toda semana, estou fazendo as pesquisas, escrevendo, publicando, orientando meus alunos de TCC, mestrado e doutorado, fazendo muitas conferências (lives)”, cita. 

A pandemia, por sua vez, se tornou um dos assuntos de um dossiê lançado por seu grupo, que ainda tem desenvolvido pesquisas sobre fake news e vigilância de dados.

Tecnologia e a sociedade

Nascido no Rio de Janeiro, veio para Salvador com os pais na juventude. Aos 17 anos, passou para Engenharia Mecânica na Ufba, em 1980. No início, se imaginava engenheiro; queria fazer projetos de máquinas. Mais ao final do curso, cresceu o interesse pelas leituras a partir da própria Engenharia. Começava, ali, a surgir um pesquisador.

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

Até então, sua área não tinha muita bibliografia sobre o impacto da tecnologia na sociedade. Queria entender os problemas causados por esse desenvolvimento.

“A gente sabia como botar as indústrias do Polo (Petroquímico de Camaçari) para funcionar. Era isso que a gente era bem ensinado, mas a minha inquietação me levou para outra coisa”, conta.

Assim, decidiu buscar um curso de pós-graduação que respondesse esses dilemas. Chegou ao mestrado em Engenharia de Produção na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ao contrário da graduação, era um curso voltado à política de ciência e tecnologia, história da ciência e filosofia da técnica. 

Foi seu primeiro movimento de transição. O segundo veio logo após concluir o mestrado, com o estudo da Sociologia no doutoramento. Era o contexto em que a revolução da informática começava a explodir. Por isso, a Sociologia apareceu como um caminho para entender as transformações tecnológicas. 

“Minha formação, embora passeie por áreas, sempre teve um interesse sobre a técnica; os objetos técnicos e a relação com a sociedade”, analisa. 

Quando estava para defender a tese, em 1995, estava acompanhado por grandes sociólogos. No entanto, para a banca, precisava de alguém que entendesse mais diretamente do que estava falando. A maioria dos franceses nem mesmo usava email. Foi assim que chegou a Pierre Lévy, que já era um expoente da área.  De lá para cá, a amizade continuou. Até livro os dois já lançaram juntos – O Futuro da Internet: em direção a uma ciberdemocracia, de 2010.

Comunicação

O professor André concluiu o doutorado em uma época em que as universidades federais ainda eram carentes de doutores. Assim, era comum que as próprias universidades buscassem pesquisadores que estivessem fazendo doutorado fora do Brasil com bolsas do CNPq ou da Capes.

Assim, foi convidado pela Facom para uma bolsa para recém-doutores.

“Eu digo que fui convidado e acolhido porque muitas escolas de Comunicação talvez não me acolhessem, porque não sou formado em Jornalismo e Comunicação”. 

Quando chegou, o professor que ministrava a disciplina de Comunicação e Tecnologia estava se aposentando. E, naquele começo, ainda sem tanta aproximação com a nova área, era a única que acreditava ter condições de ministrar. 

De lá para cá, os interesses de pesquisa se expandiram – mas sempre ligados à cultura digital e aos fenômenos contemporâneos. O projeto mais recente foi sobre Smart Cities (cidades inteligentes) e Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês). O objetivo era entender o papel dos objetos a partir das novas funções que adquiriam. 

Agora, tem estudado mais a partir da epistemologia e como a visão dos objetos é negligenciada nas teorias da Comunicação. Para o professor André, a visão hoje é muito antropocêntrica. Com isso, torna-se difícil ver os produtos e processos da cultura digital.

“Quando eu posto no Facebook, sou eu ou o Facebook (quem posta)? Eu não tenho o menor controle de para onde a minha postagem vai. Se eu penso no Facebook apenas em relação aos humanos, não vou compreender o processo”.

Assim, o projeto de pesquisa aprovado para desenvolver de 2019 a 2024 é acerca da compreensão dos processos de mediação e sobre como absorver o papel dos objetos técnicos nas suas análises da cultura digital. Se uma pessoa posta no Instagram, por exemplo, ela pensa em legenda, hashtag, em um lugar ‘instagramável’ e, assim, um objeto passa a alterar a prática das pessoas no dia a dia. 

(Foto: Arisson Marinho/CORREIO)

Em 2015, estava entre os 700 pesquisadores mais citados – entre todas as áreas. Na Ufba, apenas 27 pesquisadores estavam no ranking Webometrics Ranking of World Universities, que listou três mil profissionais com base nas citações do Google Acadêmico. Mas o maior reconhecimento talvez tenha vindo antes: em 2014, foi classificado pesquisador 1A do CNPq.

Como a maioria dos colegas, vê a classificação como um “reconhecimento” do trabalho.

“Não é um direito adquirido. Se eu começar a não ser produtivo, perco esse status”, reflete.

A produtividade, de forma geral, é avaliada por critérios como o número de publicações. No caso do professor André, a média é de cinco a seis artigos por ano.

Por paixão

“Eu faço o que gosto. Me dedico à pesquisa por prazer. Gosto de orientar, gosto de dar aula. Minha dedicação é total, mas não acho que abdiquei de nada. Minha família me acolhe muito bem, compreende minha carga de trabalho”, conta. 

Pai de dois filhos, se divide entre a rotina com a família e o trabalho. Ainda assim, não costuma passar noites trabalhando. Diz, com frequência, que é um burocrata: trabalha até meio-dia, depois das 14h às 18h. 

Aos orientandos, tenta mostrar a realidade – ou seja, “as dores e as delícias” de fazer pesquisa. Tenta estimular que prossigam com o ‘vírus’ da inquietação da pesquisa. E, em um contexto de contingenciamento e cortes orçamentários, sabe que o financiamento de pesquisadores, através de bolsas e outros auxílios, é importante. 

“Nem todo mundo tem o privilégio de trabalhar no que quer. Eu tive o privilégio pelo meu esforço e pelo governo brasileiro. Se não fosse o apoio, jamais estaria fazendo o que faço hoje. Talvez fosse um engenheiro no Polo. Talvez estivesse mais rico, mas não estaria mais feliz”. 

(Foto: Labfoto/Divulgação)

Além da vida na universidade, o professor André tem outras facetas. Uma de suas paixões, por exemplo, é a escrita. Já tem três livros de ficção lançados – dois romances e um livro de poesias. Costuma escrever nas férias, quando também aumenta a lista de livros de ficção lidos.

“Vejo algumas séries, filmes, mas sou leitor compulsivo. Leio uns 30 livros de ficção por ano e leio vários ao mesmo tempo”, revela. Em 2019, alguns dos títulos que leu incluíam Máquinas Como Eu, de Ian McEwan; A Transparência do Tempo, de Leonardo Padura, e O Sol na Cabeça, de Geovani Martins.

Respirar

A cada 15 dias, tenta ir à praia – geralmente, no Litoral Norte, entre Itacimirim, Praia do Forte e Arembepe. Gosta do contato com a natureza, ainda que sempre leve computador e alguma quantidade de trabalho. 

Quando estava para mudar para o Rio de Janeiro, por volta de 1984, descobriu o tai chi chuan. Desde então, pratica. Passou pelo judô, karatê, tae kon do, mas o tai chi trouxe equilíbrio até na respiração. 

“Me dá tranquilidade de espírito”, explica ele, que é o do tipo de pessoa que gosta de fazer listas do que fazer para se organizar. “Gosto muito de andar também, de um lugar a outro. Acalma a mente e me permite pensar melhor. Vários pensadores faziam isso. (Arthur) Schopenhauer, (Friedrich) Nietzche pensavam andando”, completa. 

Nem sempre os dias em sala de aula são fáceis. Na graduação, principalmente, não é incomum chegar para dar aula e encontrar um estudante dormindo.

“Mas eu dou a melhor aula possível, porque o aluno do lado está prestando atenção. Eu sempre brinco com a Matrix: que pílula vão tomar? A azul ou a vermelha? Eles (os alunos) já são adultos. Não tem papai e mamãe obrigando”, diz. 

O desafio para os estudantes de graduação é difícil. No filme de 1999, o protagonista precisa escolher entre as duas pílulas. Se escolher a azul, vai continuar inconsciente de que percebe a realidade como uma ilusão. Se escolher a vermelha, vai compreender que tudo que acreditou ao longo da vida era mentira.

Agora, o professor André tem sentido diariamente a desvalorização dos professores e pesquisadores das universidades federais. Sabe que a carga emocional é tão pesada que afeta até mesmo a produtividade. 

“Por isso, cada vez que eu vou falar, digo que a Ufba é um patrimônio da Bahia. Somos produtivos e a universidade está sob ataque. É preciso que as pessoas entendam que a universidade é um lugar sério”, reforça.

Formação acadêmica, segundo o Lattes:

  • 1991 – 1995
    Doutorado em Sociologia – Université Paris Descartes, Paris V, França.
  • 1991 – 1992
    Mestrado em D.E.A.- Sociologia (Cult. e Comp. nas Soc.Contemp). – Université Paris Descartes, Paris V, França.
  • 1986 – 1991
    Mestrado em Engenharia de Produção – Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  • 1980 – 1984
    Graduação em Engenharia Mecânica – Universidade Federal da Bahia, Ufba.

Produtividade em números

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Paola Jacques: buscou na favela inspiração para estudar como os corpos ocupam a cidade https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/paolajacques/ https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/paolajacques/#respond Thu, 25 Jun 2020 04:06:00 +0000 https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/?p=2791 Carioca, professora titular de Arquitetura, fez especialização, mestrado e doutorado em Paris “As fotos não podem ser com todo mundo?”, questionava a professora Paola Berenstein Jacques, […]

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Carioca, professora titular de Arquitetura, fez especialização, mestrado e doutorado em Paris

“As fotos não podem ser com todo mundo?”, questionava a professora Paola Berenstein Jacques, naquela manhã de quarta-feira, no fim do ano passado, referindo-se às seis pessoas que a acompanhavam na reunião do grupo de pesquisa Laboratório Urbano. A entrevista tinha sido marcada para logo após o encontro semanal da equipe, na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (Ufba).

A professora Paola, de óculos, à direita, costuma produzir em grupo com os pesquisadores do Laboratório Urbano
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Mais tarde, ela explicou: tímida, não gostava de chamar atenção. Parecia acreditar muito mais na construção coletiva do que na projeção individual. Por isso, ainda enquanto era fotografada, fez um pedido: que fossem evitadas imagens em que ela parecia estar no alto. “Cria uma imagem inalcançável que não gosto”, explicou a arquiteta e urbanista de 52 anos.

Paola aceitou dar entrevista por um pedido da colega Ana Fernandes
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Ela já tinha relutado a dar entrevista. Aceitou muito mais por um pedido da colega Ana Fernandes, professora e também parte desta lista de pesquisadores 1A da Ufba. O argumento de Ana foi certeiro: em um momento em que a produção científica das universidades públicas está em xeque, mais do que nunca, é preciso mostrar o que é feito ali. “Ana e Pasqualino (Magnavita) são grandes pesquisadores”, enfatizou.

Talvez esse episódio ajude a vislumbrar a visão de mundo da professora Paola, que está na Ufba desde 2002. Mais do que isso, talvez ajude a imaginar os motivos pelos quais ela se dedicou a estudar os espaços urbanos e a relação com os corpos.

“Sem dúvida alguma, o estudo das relações entre o corpo-sujeito – corpo ordinário, vivido, cotidiano – e cidade, pode nos mostrar alguns caminhos alternativos ao processo de espetacularização das cidades contemporâneas”, escreveu, em seu livro Elogio aos Errantes (Edufba), em 2010.

Paola estuda os públicos dos espaços
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Na obra, defende que os estudos de urbanismo têm negligenciado relações entre o corpo e a cidade. “Os estudos, em sua maioria, ainda têm se concentrado na história das pedras”, publicou. Cita, no texto, autores que passaram anos acompanhando a evolução do concreto – muros, casas, ruas e praças. Por isso, os interesses eram outros: não apenas os espaços públicos, mas “os públicos dos espaços”.

Paisagens pelo mundo

Nascida no Rio de Janeiro (RJ), Paola logo passou a observar as paisagens da capital fluminense, sem deixar de refletir sobre as desigualdades que se escondiam ali. “Não lembro muito bem o motivo para eu ter escolhido Arquitetura”, diz ela, que começou a graduação na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1986.

O curso era tão técnico que ela sentia falta justamente de discussões maiores; achava que a ausência de teorias da Arquitetura e do Urbanismo no currículo, de forma geral, ainda era forte. Mas essa sensação que lhe faltava algo a despertou a buscar a pesquisa. Começou como monitora, em disciplinas da graduação, mas era preciso ir além.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Quando se formou, decidiu buscar um curso fora do país. No Brasil, os programas de pós-graduação em sua área ainda eram escassos. Acabou fazendo todo o restante da formação acadêmica na França – especialização, mestrado e até o doutorado em História da Arte e da Arquitetura, concluído em Paris, em 1998.

A tese estudou justamente as favelas no Rio de Janeiro. Na época, a prefeitura da cidade tinha iniciado um programa de urbanização das então mais de 300 comunidades cariocas.

“Mas a maioria dos arquitetos e urbanistas responsáveis pelos projetos ignora o arranjo interno das favelas”, escreveu, na publicação.

No ano seguinte, retornou ao Brasil. Conseguiu uma bolsa de recém-doutor na UFRJ, onde ficaria pelos próximos três anos. Na mesma época, fez os dois primeiros de seus cinco cursos de pós-doutorado. Mas também foi nesse período que seus caminhos acabaram convergindo para Salvador.

Há cerca de 20 anos, a professora Paola participou de um encontro de pesquisadores da Arquitetura e Urbanismo, no Rio de Janeiro. Lá, estavam três professores da Ufba: Ana Fernandes, Marco Aurélio Filgueiras e Pasqualino Magnavita.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

“Ana era a diretora da escola (Faufba), na época. Eu era professora na UFRJ, mas não era concursada e eles me falaram que ia ter concurso na Ufba. Aqui tinha um programa de pós-graduação já conhecido, com professores interessantes. A Ufba é muito mais próxima que a UFRJ, que é muito grande”, analisa.

O Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Ufba foi o primeiro da área no Nordeste e um dos primeiros do Brasil: o mestrado foi criado em 1983, após dois cursos de especialização; o doutorado, por sua vez, foi instituído em 1999.

Desde então, muitas de suas pesquisas são sobre Salvador.

“A gente tem essa questão cultural e musical muito forte em Salvador. Tem uma coisa muito vital no espaço público, uma presença corporal. Acho que a Avenida Sete, por exemplo, é um mundo. Tem essa vida aberta e pulsante”, enumera.

‘Meu maior orgulho é quando os bolsistas viram professores’, afirma Paola
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Coletivo

Ela não sabe, ao certo, quando se tornou bolsista de produtividade em pesquisa – provavelmente, há mais de 15 anos. A classificação para 1A, porém, veio na última renovação, vigente desde 2017. Para a professora Paola, mais do que um recurso, foi um reconhecimento de um órgão que tanto respeita.

“O CNPq tem uma gestão muito séria. Nesse momento, defender o CNPq é fundamental. Defender o CNPq, agora, é defender o país”, acredita.

O destaque da Ufba na Arquitetura e Urbanismo, para ela, vem da própria tradição do programa. Dos dez pesquisadores 1A na área, em todo o Brasil, três são da instituição. “Mas é um trabalho coletivo”, reforça, com o argumento que destacou algumas vezes ao longo da entrevista.

“O corpo docente é bem coeso, bem próximo e isso é muito bom”, completa.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Uma das duas únicas mulheres entre as pesquisadoras 1A da Ufba, a professora Paola relaciona com a própria Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (Anpur). De 1997 a 2015, por exemplo, apenas mulheres foram presidentes da entidade.

“A Anpur é muito matriarcal. Tem um lado muito feminino nessa área do planejamento urbano”, diz. Para ela, muitas mulheres lutaram para que a área fosse, hoje, menos machista e misógina – e a Anpur teria um papel fundamental nesse processo. 

A primeira mulher a ser presidente da entidade, a professora Wrana Panizzi, ex-reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), assumiu em 1993, justamente após o mandato do notável geógrafo baiano Milton Santos. Aos poucos, o caminho foi sendo aberto para outras mulheres. 

“Preciso reconhecer a coragem de todas essas mulheres fortes – arquitetas, urbanistas, sociólogas, geógrafas, etc –  que foram presidentes da Anpur, o que sem dúvida possibilitou que nós hoje possamos estar onde estamos, sendo nacionalmente respeitadas como pesquisadoras. É preciso reconhecer historicamente essa luta feminina em nosso campo de saber”, diz a professora Paola. 

Ela também não poupa elogios ao falar da colega Ana Fernandes, que chegou a ser uma das presidentes da associação, em 2005. “Ana, para mim, é uma referência. Não me coloco no mesmo patamar. Ela fez parte da minha banca para professor titular”, conta, referindo-se à seleção de 2018.

Assim como outros pesquisadores, ela não gosta de quantificar a produtividade. Acredita que o clima de competição atrapalha a vida acadêmica.

“Acho que (a publicação) é uma consequência de tornar público o que a gente faz com dinheiro público. E, no grupo, muitas publicações são, de fato, coletivas. Meu maior orgulho é quando os bolsistas de iniciação científica viram professores”, diz.

Virtual

Durante a pandemia, o grupo Laboratório Urbano tem desenvolvido as pesquisas de forma remota. A situação não apenas impede que ela e os outros integrantes tenham acesso a acervos, arquivos públicos e bibliotecas como faz com que estejam fisicamente afastados do seu principal objeto, ao menos nas pesquisas de campo: a rua, os espaços públicos e a cidade. 

“Mas as pesquisas continuam, estamos fechando a organização de um livro – da coleção ‘Nebulosas do Pensamento Urbanístico’, que sairá pela Edufba. É um esforço coletivo que reúne equipes de pesquisadores de diferentes universidades além da Ufba”, adianta a professora Paola, citando, ainda, a UFRJ, a UFRGS, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade do Estado da Bahia (Uneb). 

O livro também é fruto de uma mesma pesquisa – Cronologia do Pensamento Urbanístico. Com essa pesquisa, participaram do Congresso Virtual da Ufba, promovido em maio, por duas semanas e com a participação de mais de 126 mil espectadores, de acordo com a instituição. 

As reuniões de pesquisa têm acontecido de forma virtual, com foco justamente na situação atual. “Temos discutido várias questões correlatas à relação entre cidades e epidemias, relação esta que perpassa toda a história do urbanismo desde a emergência desta disciplina”, explica Paola. 

Formação acadêmica, segundo o Lattes:

  • 1994 – 1998
    Doutorado em História da Arte e da Arquitetura – Université Paris 1 Pantheon-Sorbonne, França.
  • 1993 – 1994
    Mestrado em Filosofia da Arte – Université Paris 1 Pantheon-Sorbonne,  França.
  • 1991 – 1993
    Especialização em Teoria da Arquitetura – Ecole D’architecture de Paris Villemin, França.
  • 1986 – 1990
    Graduação em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.

Produtividade em números

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Albino Rubim: entre o Jornalismo e a Medicina, se tornou um especialista em políticas culturais https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/albinorubim/ https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/albinorubim/#respond Thu, 25 Jun 2020 04:02:00 +0000 https://especiais.correio24horas.com.br/ocerebrodaufba/?p=2668 Mesmo aposentado, professor orientou 15 alunos ao mesmo tempo ano passado Um dia, um amigo do professor Albino Rubim lhe disse algo que o fez tomar […]

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Mesmo aposentado, professor orientou 15 alunos ao mesmo tempo ano passado

Um dia, um amigo do professor Albino Rubim lhe disse algo que o fez tomar uma decisão. O amigo, que tinha sido docente na área da Saúde, comunicou que tinha solicitado a aposentadoria da Universidade Federal da Bahia (Ufba). “Vou me aposentar para fazer o que gosto na universidade”, afirmou o cidadão, cuja identidade não nos foi revelada. 

Naquele mesmo dia, Albino resolveu se aposentar da Ufba, em 2013.

“Quando você está aposentado, você não pode ocupar cargo e você diminui imensamente o número de reuniões que tem que ir. Então, pode se dedicar às coisas interessantes da universidade: formar pessoas, pesquisar, escrever seus textos”, explicou.

Mesmo assim, ele não parou de produzir. Sequer reduziu o ritmo. Continuou pesquisador do CNPq e seguiu ensinando na Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (Poscult) da instituição. Em algum momento do ano passado, chegou a impressionantes 15 orientações em andamento ao mesmo tempo (atualmente, são oito). 

Não é à toa que foi, por quase duas décadas, um dos pesquisadores da Ufba com produtividade 1A pelo CNPq. “O pessoal acha que aposentado não faz nada, mas faz coisas diferentes”, ponderou.

O professor Albino fez graduações em Jornalismo e Medicina ao mesmo tempo
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Na quarentena, porém, ele avalia que o trabalho foi afetado. “Claro que a quarentena afeta o ritmo de trabalho, pois temos que assumir tarefas domésticas e as reuniões ficam prejudicadas. Podemos apenas fazer reuniões virtuais”.

Desde o dia 1º de março de 2020, ele tem a classificação de pesquisador sênior no CNPq. Criada em 2005, essa bolsa tem o objetivo de reconhecer a contribuição dos cientistas em suas respectivas áreas de conhecimento e é destinada aqueles que foram 1B ou 1A – caso dele – por pelo menos 15 anos. Como o professor Albino integrava o grupo de pesquisadores durante boa parte do tempo de produção deste especial, continua fazendo parte desta seleção. 

Carreira 

Aos 66 anos, Albino Rubim deve ter feito quase tudo na Ufba. Ensinou e pesquisou na Faculdade de Comunicação (Facom), onde encarou três mandatos como diretor. Lá, ajudou a fundar o Programa de Pós-graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (o PósCom), que também coordenou. 

Até que, na gestão do ex-reitor Naomar de Almeida Filho, foi convidado para capitanear o processo de criação do Instituto de Humanidade, Artes e Cultura (Ihac), em 2008.

Pode dizer, inclusive, que participou ativamente da implantação dos revolucionários Bacharelados Interdisciplinares (BIs) – na época, o conceito era algo relativamente novo no Brasil. Encontrou tempo até para ser secretário estadual de Cultura por quatro anos, entre 2011 e 2014, no segundo mandato do ex-governador Jaques Wagner (PT). 

Em 2012, ainda secretário estadual da Cultura, participou da Lavagem da Funceb, ao lado de artistas como o cantor Denny Denan e Alinne Rosa
(Foto: Mateus Pereira/Secom BA)

Apesar de tanto trabalho administrativo – que tende a tomar muito tempo –, o professor Albino ainda conseguiu se tornar um dos maiores pesquisadores da área de políticas culturais do país. 

Um dos fundadores do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas, Albino hoje é pesquisador e professor do Programa de Pós-graduação em Cultura e Sociedade
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Medicina

No entanto, o caminho poderia ter sido outro. Em uma breve olhada em seu currículo, uma coisa chama atenção. Em 1972, ingressou na faculdade em dois cursos: em Comunicação, na Ufba, e em Medicina, na Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública. 

A indecisão comum aos adolescentes, na hora de escolher o curso no vestibular, acabou levando-o a dois cursos com grande carga de leitura. Mesmo assim, completou as duas graduações no tempo previsto (Jornalismo em 1975; Medicina em 1977). 

“Fiz jornalismo porque eu gostava muito de ler e escrever e fiz Medicina porque queria fazer psicanálise. Não tinha nada em vista para ser pesquisador”, afirmou.

Naquele contexto, inclusive, poucos professores se dedicavam à pesquisa na antiga Escola de Biblioteconomia e Comunicação (a precursora da Facom).  

O contato com o professor Othon Jambeiro foi decisivo para que as expectativas do jovem Albino mudassem. Assim que terminou o curso de Comunicação, teve a oportunidade de fazer mestrado em Ciências Sociais. Na época, não era comum que estudantes da área de Humanas fizessem mestrado. Em sua turma de formandos em Jornalismo, foi o único. Com um detalhe: ele ainda cursava Medicina. 

“Quando fiz o mestrado, comecei a vislumbrar a ideia de ser um pesquisador. Fiz uma dissertação sobre indústria cultural e fui chamado para dar aula na Facom como temporário. Mas fiz uma proposta para a Fundação Ford, que financiava projetos de pesquisa e acabou dando certo. Foi o primeiro projeto que estive à frente”, lembrou. O trabalho era sobre movimentos sociais e a imprensa dos trabalhadores. 

Enquanto isso, a rotina com a Medicina ia ficando para trás. Na Psicanálise e na Psiquiatria, era atraído pela relação entre o social e o natural. Mas foi justamente a aproximação com a área que tanto gostava que selou a escolha pela Comunicação.

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

A decisão final veio quando trabalhou no antigo Centro de Saúde Mental Mário Leal (hoje Hospital Especializado Mário Leal), no IAPI. Ali, atendia, principalmente, a população mais vulnerável. Um caso, em particular, o marcou: o de uma senhora negra, pobre, que trabalhava como lavadeira e tinha sete filhos e filhas. 

Na casa de um único cômodo, sofria violência doméstica do marido alcoolista e desempregado.  Ali, viu o quanto a própria situação era hostil à saúde mental da paciente. Sentiu-se impotente. 

“Você recupera essa pessoa, tira da crise e ela vai para a mesma situação, só que fragilizada, porque já teve uma crise. Eu não queria fazer psicanálise de pessoas mais ricas, mas também não queria isso porque era muito dramático. Você precisa ter uma estrutura psíquica forte para suportar dores tão intensas”, analisou. 

Em 2011, quando ainda era secretário, na Conferência Territorial da Região Metropolitana em Lauro de Freitas
(Foto:Ronaldo Silva/Secult BA)

Políticas culturais

Por outro lado, era um momento em que a área de Comunicação quase não tinha projetos no CNPq – ou em nenhum outro órgão de financiamento. Depois do doutorado em Sociologia na Universidade de São Paulo (USP), o professor Albino retornou à Ufba para ajudar a fundar o Póscom. 

Por 10 anos, dedicou-se aos estudos da Comunicação Política. Era uma área nova. Crescia o interesse, principalmente porque o Brasil vivia sua primeira eleição direta para presidente após a ditadura militar. 

Depois de alguns anos, decidiu mudar de campo. Escutou e driblou a surpresa de alguns colegas. “Como você vai sair dessa área agora que já é conhecido?”, diziam, referindo-se à Comunicação Política. Ali, já recebia citações nacionais e internacionais, mas os interesses tinham mudado. Tinha se voltado para as políticas culturais. 

“Política cultural é uma coisa relativamente recente na história da humanidade. E eu queria ver como o estado assumiu essa responsabilidade, porque existe o direito à cultura, assim como existem os direitos à saúde, à educação”, pontuou.

A mudança coincidiu justamente com a ida de Gilberto Gil para o agora extinto Ministério da Cultura, em 2003. Segundo o professor, foi quando houve uma mudança de paradigmas na forma como se abordava a cultura: por muito tempo, o Brasil, assim como outros países, trabalhou a ideia de uma identidade cultural. 

Com Gil, a visão era de que o país era diverso culturalmente e precisava de políticas que priorizassem essa diversidade. Para um pesquisador da área de cultura, era um prato cheio. “Eu disse: quero estudar essa gestão, essas políticas. Existem programas do governo da gestão Gil que estão em 15 países do mundo. Não são cópias literais, mas têm inspiração”.

De lá para cá, a rotina do professor Albino não mudou. Seguiu por projetos que iam desde a baianidade até o financiamento e fomento à cultura pelos estados e distritos brasileiros. Só não lembra, ao certo, a data em que se tornou 1A. Explica: a memória é “meio ruim”. Mas, garante, está tudo no Lattes. Se tem uma coisa que aprendeu é que todo pesquisador deve manter seu Currículo Lattes ‘atualizadíssimo’. 

Sabe que fez todo o caminho. “Mas se você está numa carreira e aquilo te interessa, te importa muito, você quer chegar ao máximo daquilo ali. Não é que a intenção fosse essa, mas tem aquela ambição de chegar onde se pode chegar”, refletiu. 

Em 2017, o professor Albino recebeu o sociólogo Muniz Sodré, professor da UFRJ, na abertura do Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura (Enecult), promovido pelo Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura da Ufba, do qual faz parte
Foto: Dan Figliuolo/Cult

Outro dia, fez uma conta: já orientou mais de 150 pessoas, na vida, em todos os níveis de conhecimento. Só doutores foram 18. Os doutores, inclusive, estão pelas universidades. Na Facom, viraram professores nomes como o atual vice-diretor, Leonardo Costa, e Renata Rocha. Entre os grandes jornalistas que passaram por ele, nomes como Bob Fernandes, Leandro Fortes e Cláudio Leal. 

Em 2017, o professor Albino ministrou um curso sobre políticas culturais no Enecult, na Ufba
(Foto: Dan Figliuolo/Cult)

Escrita

Pai de dois filhos e avô de um neto de 10 anos, o professor Albino diz que nunca se arrependeu da escolha da carreira. Hoje, se vê como um privilegiado. Pode não ser rico, mas faz o que gosta e tem vocação. Sabe que é a realidade de poucos. 

Entre uma viagem e outra a lugares pouco óbvios – no ano passado, foi à Eslovênia com a esposa, por exemplo – ainda pretende fazer muita coisa. Depois de passar um mês na Universidade do Equador, como professor visitante, por exemplo, ficou interessado em escrever sobre políticas culturais naquele país. 

As viagens sempre rendem inspiração. Há três anos, foi conhecer o Dia dos Mortos, comemorado no México. “Parei uma série de coisas que estava pesquisando para escrever um artigo sobre isso, que é culturalmente excepcional. Tem essa coisa de ir para os lugares, ficar atento e escrever sobre. Projetos não faltam”, garantiu. 

Formação acadêmica, de acordo com o Lattes

  • 1980 – 1987
    Doutorado em Sociologia – Universidade de São Paulo (USP)
  • 1976 – 1979
    Mestrado em Ciências Sociais – Ufba
  • 1972 – 1977
    Graduação em Medicina – Escola Bahiana de Medicina
  • 1972 – 1975
    Graduação em Comunicação – Universidade Federal da Bahia – Ufba, Brasil

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Professor titular da Facom, ele passou da graduação direto para o doutorado

O professor Marcos Palacios quer escrever mais ficção. A aposentadoria, há quatro anos anos, inicialmente não significou um afastamento da Universidade Federal da Bahia (Ufba), onde foi professor por 34 anos. Assim como parte dos pesquisadores com produtividade 1A do CNPq na instituição, mesmo aposentado, continuou com o ritmo intenso. 

No início, nada foi interrompido: pesquisa, orientações de mestrado e doutorado, reuniões de grupo de pesquisa, escrita de artigos científicos. Mas, depois de quatro anos assim, anunciou: quando cumprisse a vigência de sua última bolsa do CNPq, não solicitaria renovação.

Ou seja, desde o dia 1º de março de 2020, ele não faz mais parte da lista dos 1A. Como integrava o grupo de pesquisadores durante boa parte do tempo de produção deste especial, continuou fazendo parte dessa seleção.

“Acho que já cumpri um percurso longo de pesquisa. Se você olhar no Lattes, vai ver quantos orientandos de mestrado e doutorado já formei. Acho que é tempo de me dedicar a outras atividades”, explica ele, hoje com 71 anos. 

De fato, foram pelo menos 39 mestres e 19 doutores orientados diretamente por ele. Mais do que isso: boa parte dos jornalistas da Bahia passou por sua sala de aula, na Faculdade de Comunicação (Facom). Quem não foi seu aluno provavelmente aprendeu com quem foi. 

É por isso que, agora, o professor Palacios tem outros planos. Sente que já cumpriu sua missão. Quer se dedicar, de forma mais séria, a uma paixão antiga: a escrita de ficção, com destaque para os contos.

“Tenho coisas esparsas publicadas, inclusive na internet, e publicações avulsas. A partir de agora, vou me dedicar mais seriamente a isso. Estou escrevendo uma coletânea desses contos para publicar de forma impressa”, adianta. Na internet, é possível conferir trabalhos como As Torres de Abraham e A Mulher que Vivia Longe do Mar

Mesmo assim, ele contou que estará disponível para o que chamou de “atividades acadêmicas eventuais e pontuais”, a exemplo da participação em bancas de pós-graduação ou concursos públicos, consultorias em projetos de pesquisa e emissão de pareceres.

As mudanças trazidas covid-19 não interferiram nesses planos – que incluem as últimas orientações de mestrado e doutorado até março de 2021. No próximo ano, ainda está previsto um período como professor visitante na Universidade da Beira Interior, em Portugal, por um período de três a seis meses.

“A pandemia não está afetando nenhum desses compromissos já assumidos. Mantenho igualmente minha disponibilidade como consultor ad hoc de várias revistas científicas nacionais e estrangeiras, bem como projetos em andamento no Grupo de Pesquisa em Jornalismo On-Line”, diz. Consultores ad hoc (latim) são aqueles que revisam trabalhos científicos para publicação.

O professor Palacios agora quer se dedicar de forma mais séria à ficção
(Foto: Betto Jr./CORREIO)

Mudança

No fim dos anos 1960, com a ditadura militar no Brasil, o jovem Marcos Palacios se viu diante da prisão de vários companheiros. Militante do movimento estudantil, participava de passeatas e tinha acabado de se tornar presidente da União Paulista de Estudantes Secundaristas antes de ter que deixar São Paulo, sua cidade natal.

Decidiu vir para Salvador. Na época, a Tribuna da Bahia começava a se formar. Até então, existia apenas uma revista – a Tribuna Econômica.

“Procurei um editor da revista, fiz um teste e fui aprovado. Eu tinha experiência amadora de jornalismo no movimento estudantil, produzindo jornais estudantis. Minha experiência jornalística foi nesse nível”, lembra. 

Amador ou não, após seis meses trabalhando na revista, foi chamado para começar no novo jornal em 1969. Começou como copidesque (uma espécie de função de editor e revisor nos antigos jornais). Pouco tempo depois, se tornou chefe de reportagem, enquanto cursava Economia na Ufba. Ficou lá até 1972, quando foi para a Inglaterra. 

Foi nessa época que sua vida acadêmica passou por uma reviravolta completa. Um pesquisador britânico da Universidade de Oxford veio para a Bahia para pesquisa de doutorado e procurou a ex-esposa do professor Palacios. Ela era autora de uma reportagem pela qual se interessara. Só que ela não falava inglês e pediu ajuda ao então marido. 

Os três se encontraram, conversaram e ficaram próximos. De maneira informal, Palacios começou a trabalhar com o pesquisador britânico, que tornou-se professor da Universidade de Liverpool, assim que voltou à Inglaterra. “Imediatamente, ele me fez esse convite para estudar lá. Num espírito um pouco aventureiro, eu e minha mulher saímos daqui e fomos para Liverpool”, lembra. 

No início, viajou por conta própria. Depois de um ano cursando a graduação em Sociologia, conseguiu uma bolsa de estudos. Logo em seguida, começou o mestrado em Sociologia Latino-americana. É nesse momento que o seu currículo se torna um tanto diferente da maioria dos pesquisadores: o mestrado se transformou em um doutorado. 

Depois de apenas um ano de mestrado, fez um ‘upgrade’ a convite de seu orientador. Essa é uma situação tão excepcional que, dentre os 19 doutores que o professor Palacios já formou na Ufba, só viu acontecer uma única vez. 

“Trabalhei sobre a questão de propriedade social no Peru e fiz trabalho de campo por um ano, apoiado por uma bolsa da Fundação Ford”, lembra, referindo-se aos 12 meses em que esteve pesquisando na região sul peruana, nas imediações do Lago Titicaca. Na época, era um trabalho que já tocava aspectos da imprensa, a exemplo da repercussão da criação de um sistema de propriedade social nos jornais do país. 

Ao contrário da maioria dos pesquisadores, o professor Palacios foi da graduação direto ao doutorado
(Foto: Betto Jr./CORREIO)

Sociologia

Depois do doutorado, chegou a fazer concurso para ensinar na University College of Swansea, no País de Gales. Passou dois anos lá até que, 1982, decidiu voltar ao Brasil. Passou um ano como professor visitante no Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (UFPA), antes de começar a trabalhar no departamento de Sociologia. A comunicação voltou à sua vida nessa época – quando se tornou o responsável pela disciplina Sociologia da Comunicação. 

Em 1986, quando soube que a Faculdade de Comunicação estava se separando da Escola de Biblioteconomia da Ufba, decidiu voltar a Salvador. Queria fazer parte do novo momento da Facom, que buscava rumos mais independentes. 

“Assim que cheguei, uma das tarefas era a criação de uma pós-graduação e de uma área de pesquisa”, lembra.

De imediato, implantaram um curso de especialização em Comunicação Comunitária. Enquanto isso, ele e outros professores – alguns que hoje também são pesquisadores do CNPq, como os professores Albino Rubim e Wilson Gomes – organizavam a criação do primeiro mestrado em Comunicação do Norte e Nordeste do Brasil. 

Entre 1987 e 1988, o professor Palacios apresentou o primeiro projeto de pesquisa do CNPq. Ali, começava o caminho para chegar no estágio em que esteve até o último mês de fevereiro – a classificação máxima veio oito anos antes de se aposentar, entre 2010 e 2011.  

Para ele, ter se tornado pesquisador 1A foi uma consequência natural
(Foto: Betto Jr./CORREIO)

“Não acredito que nenhum pesquisador do CNPq tenha o objetivo de se tornar 1A. Eu diria que é um processo normal do pesquisador que tem uma carreira continuada e longa. No meu caso, recebi a classificação como uma honraria, uma premiação”, opina.

Jornalismo online

Talvez por isso Palacios não imaginasse que se tornaria um dos principais nomes dos estudos do Jornalismo Digital no Brasil. Fundado por ele em 1997, o Grupo de Pesquisa em Jornalismo Online (Gjol) já estudava os sites de notícias quando a maioria dos brasileiros nem mesmo tinha internet em casa.

“O Gjol foi se tornando cada vez mais importante em termos dos acordos de colaboração que foram sendo feitos. Começamos de forma bastante modesta, mas, à medida que fomos ganhando credibilidade, fomos buscando mais parceiros fora da universidade”, explica. Os convênios do grupo já chegaram a incluir 14 instituições do Brasil e da Europa, além da Ufba.

Hoje, ao redor do grupo, existe uma rede nacional de pesquisadores, coordenada pelo professor Palacios e pela professora Suzana Barbosa, atual diretora da Facom. Com a saída definitiva do professor, a partir de abril, ela deve assumir a coordenação total do projeto.

Uma das instituições que têm parceria com o Gjol é a Universidade da Beira Interior, em Portugal. Em 2014, o professor Palacios participou de um congresso ao lado dos professores Paulo Serra e João Canavilhas (na mesa), na universidade
(Foto: Reprodução/Facebook)

Agora, ele ficará na categoria de professor Colaborador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PósCom). Até o fim do ano e início do próximo, ainda terá os últimos orientandos de mestrado e doutorado. No entanto, após o fim desse ciclo, não deve aceitar novos estudantes.

“A cada momento, temos experimentado inovação dentro do jornalismo. Você já teve um momento em que, se havia um furo, era guardado para a edição impressa. Hoje, a coisa é lançada primeiro no jornal online. Eu vim acompanhando, ao longo desse tempo, o crescimento da internet enquanto plataforma de produção da informação jornalística”, explica. 

Para ele, uma de suas maiores contribuições foi a formação de novos pesquisadores – dos projetos de iniciação científica aos doutoramentos. “A ciência se faz por interlocução. Ninguém faz ciência sozinho. Você pode ser um gênio, mas não faz ciência sozinho”, reforça.  

Em casa, o tempo que dedica à pesquisa nunca foi um problema. Sua esposa, a professora Annamaria Palacios, também é pesquisadora e professora da Facom. Dos três filhos, dois fizeram cursos de Comunicação – uma formou-se produtora cultural; outro é jornalista e trabalha na Deutsche Welle, a empresa pública de comunicação da Alemanha. 

Antes de ser professor da Ufba, Palacios ensinou no País de Gales e na UFPA
(Foto: Betto Jr./CORREIO)

O mais novo, que está concluindo Administração, também deve enveredar pelo caminho dos pais – hoje, sua principal área de interesse é o marketing digital. 

Entre uma pesquisa e outra, contudo, consegue se organizar para viajar com a esposa. No ano passado, fez uma viagem de 20 dias, de carro, pelos estados da região sul do Brasil. “Fora isso, me interesso muito por cinema. Em Salvador, somos privilegiados em termos de programação cinematográfica com as salas de arte”, diz. 

Formação acadêmica, segundo o Lattes:

  • 1975 – 1979
    Doutorado em Sociologia – University of Liverpool, Inglaterra.
  • 1972 – 1975
    Graduação em B A Sociology – University of Liverpool, Inglaterra.

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Em 2020, completou 61 anos de Ufba – exatamente o mesmo aniversário que a Faculdade de Arquitetura

A primeira surpresa veio logo no email de resposta. Em seu texto, o professor Pasqualino Magnavita explicava como poderia atender ao pedido de entrevista do CORREIO. Informava que morava em Itaparica, na Região Metropolitana de Salvador (RMS), e que, mesmo aos 90 anos, continuava lecionando no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia (Ufba).

Hoje, em 2020 e já com 91 anos, o professor Pasqualino é o mais longevo dos pesquisadores com produtividade 1A da Ufba. Talvez seja um dos mais antigos, inclusive, de toda a Ufba – pelo menos em atividade, ainda que seja aposentado desde 1995. Para continuar o ritmo, antes da quarentena pela pandemia do novo coronavírus, que suspendeu aulas na instituição, pegava o ferry-boat uma vez por semana para vir a Salvador.

Na resposta, ele explicou que preferia dar entrevista por email. Enviou, alguns dias depois, um arquivo de 11 páginas. Em alguns momentos, cita Michel Foucault e Jean Baudrillard, além de inúmeros conceitos da filosofia. Os livros de filósofos, explica, o atraíram desde a adolescência.

“Pesquisar depende muito da forma de pensar e, de fato, este objetivo foi minha permanente preocupação existencial”, explicou, referindo-se ao seu interesse pela pesquisa. Em 2019, completou 60 anos de Ufba – exatamente o mesmo aniversário que a Faculdade de Arquitetura (Faufba).

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Quando começou a trajetória acadêmica, em 1947, não existia Faufba. O curso era ligado à Escola de Belas Artes.  Fez, naquela época, Engenharia Civil. Por isso, em 1952, um ano após se formar, se inscreveu para estudar Arquitetura na Universidade de Roma. Retornou a Salvador cinco anos depois para trabalhar profissionalmente e se envolver diretamente com a futura Faufba. 

A história do professor confunde-se com a própria história da faculdade. Lá, tornou-se uma figura icônica. “Os suspensórios são a marca dele”, contou uma orientanda que o acompanhava no dia em que encontrou a equipe do CORREIO para ser fotografado. Os acessórios, que adotou há uns 30 ou 40 anos para substituir o tradicional cinto, vinham com uma calça amarela presa com uma corrente de metal e tênis esportivos. Nos cabelos, um nó formava um coque baixo despojado. 

Nada, em sua figura, parecia com o estereótipo de um senhor nonagenário. Subia e descia as escadas da faculdade com a disposição de alguém que faz exercícios físicos duas vezes por semana. Talvez a receita para a jovialidade seja a morada em Itaparica; talvez seja o contato constante com o conhecimento. 

O professor Pasqualino é um dos fundadores da Faufba
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

“A vida no sentido informal foi sempre, para mim, um campo de indagação, particularmente, no universo conceitual da filosofia e na dimensão perceptiva e afetiva da arte, pois, sempre considerei intuitivamente a filosofia como matriz da forma de pensar, o lugar onde o pensamento se orienta e a arquitetura como universo da arte”, disse.

As mudanças de rotina, garante, não têm prejudicado a pesquisa sobre a chamada neuroarquitetura – campo que une os estudos da neurociência com a arquitetura. “Conto com mais tempo disponível. Inclusive, estou elaborando um texto sobre Geofilosofia e Geopolítica em tempos de pandemia”, adiantou, poucos dias antes da publicação deste especial.

Doutores
Filho de italianos – o pai chegou na Bahia em 1898, aos 14 anos -, o professor Pasqualino teve 13 irmãos. O objetivo de seu pai, que trabalhou como agrimensor e comprou um terreno onde plantava cacau para sustentar a família, era que seus filhos estudassem. Queria que fossem “doutores”, como não tivera a oportunidade de ser. 

De fato, vieram doutores na família. A irmã mais velha foi uma das fundadoras da Faculdade de Filosofia, Língua e Literatura Italiana enquanto outros três irmãos foram professores da Ufba. Duas sobrinhas e um sobrinho, já aposentados ou em aposentadoria, também foram docentes na instituição. 

“Muitos de meus intercessores, filósofos, cientistas e artistas enquanto agenciamentos coletivos, me influenciaram bastante, contudo, não sei até que ponto, os meus entendimentos teóricos e as minhas atividades práticas repercutiram plenamente nas pessoas com as quais convivi”.

Até a década de 1970, não havia pesquisadores doutores formados no Brasil. O seu doutorado, inclusive, foi concluído na Universidade de Roma, em 1964. Isso o habilitou para participar da banca de seleção dos primeiros doutores na área no país, na Universidade de São Paulo (USP). 

Na Bahia, o mestrado só foi criado em 1983, coordenado por ele. O doutorado, por sua vez, apenas em 2000. Anos antes, em 1974, criou, com colegas o grupo de pesquisa chamado Núcleo de Estudos de Habitação. Mais tarde, o grupo seria responsável por avaliar diversos conjuntos habitacionais do Banco Nacional de Habitação em bairros populares de Salvador. 

Os suspensórios são a marca dele; usa há mais de 30 anos
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Ainda nos tempos da Engenharia, se encantou por dois grandes temas: a Psicanálise e a Teoria da Relatividade. A ida à Itália, que aconteceu nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial, fez com que tivesse contato com movimentos sociais inspirados na União Soviética. Foi ali que aconteceu o que chama de sua “primeira e grande desterritorialização”: passou a frequentar o Instituto Cultural Antonio Gramsci, que levou-o à forma de pensar do materialismo histórico e dialético, conceitos marxistas. 

“O interesse pela produção de arquitetura e arte de interesse social marcaram, então, as minhas subsequentes atividades teóricas e práticas no magistério universitário. E isto (ocorreu) com maior intensidade a partir dos atos institucionais que desrespeitaram os direitos civis com a implantação em 1964 do regime militar”, explicou. 

Durante a ditadura, viu disciplinas como a Composição Arquitetônica e Filosofia da Arquitetura passarem a ser chamadas de Planejamento e Teoria, respectivamente – as mudanças foram parte de uma reforma após acordos negociados entre o Ministério da Educação (MEC) e a United States Agency for International Development (USAID) na ditadura militar. Naquele momento, despertou para as edificações de interesse social, sempre relacionadas a temas como habitação, saúde e educação. 

O pensamento filosófico está presente em seus projetos de pesquisa. O mais recente, de 2016 para cá, usa justamente os conceitos de diferença e repetição no plano de imanência filosófico do pensamento rizomático. Tudo isso no âmbito da teoria e da crítica da Arquitetura contemporânea. 

Na Filosofia, de acordo com os pensadores Gilles Deleuze e Félix Guattari, o rizoma é um conceito inspirado na Biologia. Assim, o pensamento rizomático é aquele que se abre como raízes. É um pensamento aberto para experimentações e se espalha em todas as direções.

“Trata-se de uma pesquisa que envolve as três formas de pensar e criar: Filosofia, Ciência e Arte, pois, elas se cruzam, se entrelaçam e fazem do pensamento uma Heterogênese. O enfoque maior é reservado à questão da criatividade, pesquisando as condições dos ‘territórios existenciais’ das subjetividades tanto a individual quanto a coletiva”, diz a descrição.

Ele não pretende parar: após o fim dessa bolsa, o plano é solicitar outra
(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Aposentadoria

Para muita gente, a aposentadoria poderia ser sinônimo de descanso. De lidar com outros aspectos da vida que não o trabalho formal. No entanto, mesmo entre tantos colegas da Ufba que, mesmo aposentados, continuam a todo vapor na pesquisa, o caso de professor Pasqualino se destaca. 

Em 1995, decidiu se aposentar, aos 65 anos de idade. Na época, o então presidente Fernando Henrique Cardoso tinha enviado uma proposta de reforma da previdência ao Congresso Federal. Aprovada três anos depois, a Emenda Constitucional 20 determinou a troca de tempo de serviço pelo tempo de contribuição. 

Foi assim que os homens passaram a poder se aposentar depois de 35 anos de trabalho. Com as mulheres, o prazo foi de 30 anos. Só que, nesse contexto, muitos professores passaram a pedir aposentadoria – incluindo o professor Pasqualino. 

(Foto: Marina Silva/CORREIO)

Quando completou 70 anos, solicitou a obtenção do nível 1A em produtividade pelo CNPq. Desde 1988, participava como membro do Comitê Assessor do órgão, avaliando, inclusive, programas de pós-graduação. 

A classificação aconteceu em 2003. Para ele, foi consequência natural, ainda que – como destaca em suas respostas – estivesse “ciente de que as inovações filosóficas e a produção arquitetônica como pesquisa sensorial/especial (perceptiva e afetiva), como arte” não viesse tendo acolhimento no órgão federal. 

“Vale salientar que, progressivamente, através da micropolítica da subjetivação, venho ‘dissolvendo’ o Eu e a Competição e evidenciando ‘Anonimato’ como princípio (embora ainda utópico), e cada vez mais, estou apostando no Nós e na Cooperação, socializando, assim, a existência!”, exclamou.

Para continuar ensinando na Faufba, solicitou a bolsa de produtividade ao CNPq pela primeira vez. Na época, já ensinava no mestrado e já tinha “timidamente” publicado alguns artigos. Até então, a publicação não era exigência. De lá para cá, começou a produzir artigos e teve nove projetos apresentados e aprovados ao CNPq. 

Os primeiros oito geraram 24 artigos e 14 capítulos de livro. “A minha previsão é publicar um livro ainda este ano, comemorando os meus 90 anos e outro no final da atual bolsa”, adiantou. Sua bolsa atual vai até o fim deste ano e não pensa em parar. Já avisou: “se a saúde mental e corporal permitir”, fará um novo projeto e vai pedir a renovação.

“Não é somente você resistir. A resistência tem que ser criativa”, afirmou o professor Pasqualino Magnavita, em um depoimento para as comemorações do aniversário de 70 anos da Ufba, em 2016

Formação acadêmica, de acordo com o Lattes 

  • 1952 – 1964
    Doutorado em Arquitetura – Universidade de Roma, U.R., Itália. 
  • 1947 – 1951
    Graduação em Engenharia Civil – Ufba

O post Pasqualino Magnavita: o arquiteto de 91 anos que é um dos maiores pesquisadores da Ufba apareceu primeiro em Cérebros da Ufba.

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