Ao receber um dos mais importantes prêmios literários brasileiros, o professor João José Reis avisou: seus livros, artigos e capítulos eram escritos com paixão pelos temas que tratavam. Não prometia a objetividade perfeita, mas dizia não permitir que suas inclinações ideológicas pautassem as interpretações sobre o que escrevia
“História panfletária, nem pensar! Me curvo às evidências que brotam dos arquivos e elas não cessam de surpreender com um universo muito mais complexo do que caberia numa explanação fácil e porventura maniqueísta, que divida o mundo entre o herói e o bandido”, disse, na cerimônia de entrega do Prêmio Machado de Assis, em 2017, ao ser homenageado pelo conjunto da obra.
Só para dar uma ideia, desde 1941, nomes como Rachel de Queiroz, Gilberto Freyre, Guimarães Rosa e Cecília Meireles já receberam o prêmio. Mas esse reconhecimento tem sido constante: aos 68 anos, o professor João Reis ganhou outras tantas honrarias, ao longo da vida.
O alcance é mundial: além de ser considerado um dos maiores historiadores do Brasil, é referência internacional nos estudos sobre escravidão, resistência escrava, movimentos sociais e história atlântica.
Assim, não poderia ser diferente: ele é um dos pesquisadores com produtividade em pesquisa 1A pelo CNPq na Universidade Federal da Bahia (Ufba), onde começou a ensinar em 1979, na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FFCH).
“Meu interesse pela pesquisa veio na universidade, antes não imaginava que me tornaria pesquisador. Talvez um pouco no último ano do Ensino Médio, mas não fazia a mínima ideia do que era pesquisa histórica”, contou, em entrevista ao CORREIO. Ele preferiu responder por email.
Ele dá créditos às universidades onde estudou: “A Ufba, onde estudei Ciências Sociais, e a Ucsal (Universidade Católica do Salvador), onde estudei História, me deram régua e compasso para prosseguir estudando e pesquisando na pós-graduação”.
Na entrevista, o professor João Reis foi sucinto. Não quer dizer que não tenha uma trajetória longa. Pelo contrário: se alguém for imprimir seu currículo Lattes, por exemplo, vai ter que se preparar para uma sequência de 25 folhas. Só entre livros completos publicados ou organizados, são 16 listados na página online, publicados desde 1983.
Em agosto do ano passado, lançou mais um livro – Ganhadores: a greve negra de 1857 na Bahia, publicado pela Companhia das Letras. Na obra, o professor conta a história dos negros de ganho (como eram chamados aqueles que repassavam seus ganhos aos seus proprietários) que protagonizaram o episódio de uma greve que paralisou o transporte de Salvador em 1857.
Capítulos de livro, por outro lado, são pelo menos 58. Para ele, parece ser natural. Mesmo sem vir de uma família de pesquisadores, diz não ter sido desestimulado a seguir a carreira acadêmica em nenhum momento da vida. “Vira vício”, explica ele, que nasceu em Salvador.
O mestrado e o doutorado vieram ainda entre a segunda metade da década de 1970 e o início dos anos 1980 – os dois em História, na University of Minnesota System, nos Estados Unidos, com bolsas da Fundação Ford. Após completar os créditos e a qualificação para o doutorado, mas antes mesmo de concluir a tese, tornou-se professor da Ufba.
Na universidade, conta ter sido bem recebido tanto por alunos quanto por colegas. Mesmo assim, sentiu dificuldade, no início. Na época, as diferenças entre um ambiente de pesquisa e outro eram mais acentuadas.
“Naturalmente, é um choque quando se chega de uma universidade cheia de recursos como a que frequentei nos EUA e encontra as condições precárias de nossas universidades. Na época era especialmente chocante a pobreza das nossas bibliotecas, por exemplo. Hoje estamos melhor, mas ainda longe dos melhores padrões internacionais. Se investe pouco em educação e pesquisa no Brasil, menos ainda agora”, diz.
Hoje, alguns de seus principais estudos são sobre a sociedade, a cultura e a resistência da Bahia ao longo do século 19. Há desde a pesquisa sobre a sociedade a partir das tensões e conflitos sociais, bem como as dimensões culturais, até a investigação sobre os movimentos sociais. Nesse aspecto, estão incluídas as revoltas e fugas de pessoas escravizadas, relações escravistas e biografias de escravos africanos.
O professor João José não lembra, ao certo, quando se tornou pesquisador 1A – talvez tenha sido há uns 20 anos, depois de passar por todos os níveis de classificação. No entanto, ele explica, na prática, o significado do auxílio: vai desde recurso para viagens de pesquisa, participação de congressos até compra de livros e equipamentos.
“Essas possibilidades turbinam a pesquisa científica, naturalmente”, reflete.
Ressalta, porém, que a investigação científica não é exclusiva dos bolsistas em produtividade. “Significa que a Ufba tem pesquisadores bem avaliados pela comunidade científica nacional. Mas não são apenas bolsistas do CNPq, de qualquer nível, que fazem pesquisa”.
Ao longo da trajetória acadêmica, formou quase 30 mestres e pelo menos sete doutores, de acordo com o seu Lattes. O número deve aumentar: há outros três futuros mestres e quatro doutorandos sendo orientados.
Preferiu não entrar em detalhes sobre quantos pesquisadores tinha incentivado a seguir a carreira. “Quanto a influenciar outras pessoas, creio que sim, é a sina do professor, não?”, respondeu.
O momento, porém, o preocupa. Os seguidos cortes e contingenciamentos nas agências de fomento, como o próprio CNPq, e nas universidades, não representam um futuro animador.
Acredita que será “um desastre” para a ciência brasileira – sobretudo com a suspensão de bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Para ele, o impacto negativo nas Ciências Humanas deve ser maior para os jovens pesquisadores.
“Não vejo com muito otimismo nosso futuro do Brasil enquanto nação produtora de ciência. Estamos dando para trás depois de quase 20 anos de bons ventos. Caminhamos para nos tornamos um país colonizado pela ciência alheia”, lamenta.
orientações de mestrado em andamento
orientações de doutorado em andamento
orientações de mestrado concluídas
orientações de doutorado concluídas
participações em bancas de mestrado
participações em bancas de doutorado
participações em bancas de professor titular
participações em bancas de concurso público
artigos completos publicados em periódicos
livros publicados/organizados ou edições
capítulos de livros publicados
apresentações de trabalho